Na quarta-feira de cinzas, 22 de fevereiro, foi lançada a Campanha da Fraternidade 2012, este ano sobre o tema Fraternidade e Saúde Pública e com o lema Que a saúde se difunda sobre a terra (cf. Eclo 38,8). A saúde sempre foi uma das primeiras preocupações do povo brasileiro. Historicamente, no entanto, está aquém do que se deseja. Quando pensamos na saúde do Brasil, nos vêm à mente cenas como falta de vagas em hospitais, leitos nos corredores, filas intermináveis, espera de meses por atendimentos especializados, bem como a luta dos profissionais contra a falta de equipamentos, medicamentos, ou contra a própria estrutura precária dos estabelecimentos de saúde.
Desde a Constituição de 1998, está garantida a universalidade e gratuidade da saúde. Com a criação do SUS, tentou-se alcançar esse ideal, mas a complexidade e custos crescentes têm tornado essa luta como uma batalha contra moinhos de vento. Houveram algumas batalhas vencidas: podemos citar a criação do PSF (Programa de Saúde da Família), com a ênfase na prevenção; ou o combate contra a aids, elogiado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), mas a enormidade do desafio parece muitas vezes invencível. Ainda surgiram outros desafios com a vida moderna e sua exigência de perfeição e concorrência cada vez maiores: estão na moda doenças que nossos avós pouco conheciam – o estresse, a depressão, o sobrepeso. O aumento da expectativa de vida e a diminuição do índice de fecundidade (que chegou a 1,8 nascimentos por mulher em 2008, menos do que o necessário para repor a população) e o consequente aumento da população idosa fazem com que doenças crônico-degenerativas e o câncer sejam cada vez mais prevalentes. Também a tragédia do crack está alcançando até as menores cidades.
Esse é o quadro que se pinta quando se pensa nas condições de saúde no Brasil. Mas a saúde é mais que a ausência de doenças, como definiu a OMS em 1946: “é um estado de completo bem-estar físico, mental e social”. A OMS, em 2003, incluiu também o estado de bem-estar espiritual como fator indispensável para a saúde integral. Olhando novamente para a situação do Brasil, descobrimos então que a realidade está mais longe ainda do ideal. A condição social de muitos brasileiros é absolutamente precária. Apesar de sermos hoje a sexta economia do mundo, milhões vivem em favelas, em meio à violência, falta de infraestrutura básica, vitimados pela miséria ou ainda flagelados pela seca.
A espiritualidade também vive momentos difíceis. Foi demonstrado em várias pesquisas pelo mundo que pacientes que têm fé e rezam têm uma recuperação mais rápida, e menos consequências negativas de suas doenças. A religiosidade sempre fez parte da vida humana desde tempos imemoriais. Jamais houve qualquer povo que não a tivesse. As previsões da “morte de Deus” sempre mostraram-se muito equivocadas.
Mas vemos hoje, principalmente entre a juventude, um afastamento e desilusão para com a religião de seus pais. A frequência à missa dominical é bem menor em comparação ao tempo de nossos pais e avós. O hedonismo e o individualismo acabam falando mais alto, e muitos não têm mais tempo de pensar na saúde de sua alma frente à correria do mundo moderno e suas várias distrações: a televisão, a praia, a cerveja com os amigos… Quanto melhor a condição social, maiores as distrações – como na parábola em que um homem diz à sua alma: descansa, tu já tens bens para muitos anos.
Em países mais ricos, de fato, o ateísmo ou a indiferença religiosa alcançaram níveis alarmantes, e tudo indica que o Brasil vai indo pelo mesmo caminho. Os mais pobres, por outro lado, acabam muitas vezes vitimados pela teologia da prosperidade e sua inversão dos valores evangélicos.
O descuido com a saúde da alma pode ter consequências profundas – a perda do sentido da vida, a busca de refúgio nas drogas lícitas e ilícitas, a depressão entre jovens e até entre crianças –, o que era impensável anos atrás. Temos muito que pensar: para onde estamos caminhando? Podemos lembrar a resposta de Deus ao homem rico da parábola: “Insensato, nessa mesma noite ser-te-á reclamada a alma. E as coisas que acumulastes, de quem serão?” Temos que ser ricos em primeiro lugar para Deus.
Como fazer então para que o povo brasileiro possa ter saúde abundante em todos seus aspectos: saúde corporal, psicológica, social e espiritual? Que essa quaresma sirva para que possamos meditar e buscar soluções para tamanho desafio, de forma que um dia realmente possamos afirmar que a saúde se difunde sobre a terra.
* Gil Vicente Thomas é seminarista da Diocese de Rio Grande.
Desde a Constituição de 1998, está garantida a universalidade e gratuidade da saúde. Com a criação do SUS, tentou-se alcançar esse ideal, mas a complexidade e custos crescentes têm tornado essa luta como uma batalha contra moinhos de vento. Houveram algumas batalhas vencidas: podemos citar a criação do PSF (Programa de Saúde da Família), com a ênfase na prevenção; ou o combate contra a aids, elogiado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), mas a enormidade do desafio parece muitas vezes invencível. Ainda surgiram outros desafios com a vida moderna e sua exigência de perfeição e concorrência cada vez maiores: estão na moda doenças que nossos avós pouco conheciam – o estresse, a depressão, o sobrepeso. O aumento da expectativa de vida e a diminuição do índice de fecundidade (que chegou a 1,8 nascimentos por mulher em 2008, menos do que o necessário para repor a população) e o consequente aumento da população idosa fazem com que doenças crônico-degenerativas e o câncer sejam cada vez mais prevalentes. Também a tragédia do crack está alcançando até as menores cidades.
Esse é o quadro que se pinta quando se pensa nas condições de saúde no Brasil. Mas a saúde é mais que a ausência de doenças, como definiu a OMS em 1946: “é um estado de completo bem-estar físico, mental e social”. A OMS, em 2003, incluiu também o estado de bem-estar espiritual como fator indispensável para a saúde integral. Olhando novamente para a situação do Brasil, descobrimos então que a realidade está mais longe ainda do ideal. A condição social de muitos brasileiros é absolutamente precária. Apesar de sermos hoje a sexta economia do mundo, milhões vivem em favelas, em meio à violência, falta de infraestrutura básica, vitimados pela miséria ou ainda flagelados pela seca.
A espiritualidade também vive momentos difíceis. Foi demonstrado em várias pesquisas pelo mundo que pacientes que têm fé e rezam têm uma recuperação mais rápida, e menos consequências negativas de suas doenças. A religiosidade sempre fez parte da vida humana desde tempos imemoriais. Jamais houve qualquer povo que não a tivesse. As previsões da “morte de Deus” sempre mostraram-se muito equivocadas.
Mas vemos hoje, principalmente entre a juventude, um afastamento e desilusão para com a religião de seus pais. A frequência à missa dominical é bem menor em comparação ao tempo de nossos pais e avós. O hedonismo e o individualismo acabam falando mais alto, e muitos não têm mais tempo de pensar na saúde de sua alma frente à correria do mundo moderno e suas várias distrações: a televisão, a praia, a cerveja com os amigos… Quanto melhor a condição social, maiores as distrações – como na parábola em que um homem diz à sua alma: descansa, tu já tens bens para muitos anos.
Em países mais ricos, de fato, o ateísmo ou a indiferença religiosa alcançaram níveis alarmantes, e tudo indica que o Brasil vai indo pelo mesmo caminho. Os mais pobres, por outro lado, acabam muitas vezes vitimados pela teologia da prosperidade e sua inversão dos valores evangélicos.
O descuido com a saúde da alma pode ter consequências profundas – a perda do sentido da vida, a busca de refúgio nas drogas lícitas e ilícitas, a depressão entre jovens e até entre crianças –, o que era impensável anos atrás. Temos muito que pensar: para onde estamos caminhando? Podemos lembrar a resposta de Deus ao homem rico da parábola: “Insensato, nessa mesma noite ser-te-á reclamada a alma. E as coisas que acumulastes, de quem serão?” Temos que ser ricos em primeiro lugar para Deus.
Como fazer então para que o povo brasileiro possa ter saúde abundante em todos seus aspectos: saúde corporal, psicológica, social e espiritual? Que essa quaresma sirva para que possamos meditar e buscar soluções para tamanho desafio, de forma que um dia realmente possamos afirmar que a saúde se difunde sobre a terra.
* Gil Vicente Thomas é seminarista da Diocese de Rio Grande.
* Publicado originalmente no site Adital.
Postado por: Leonardo Araújo
Nenhum comentário:
Postar um comentário