por Leonardo Fontenelle
.OK, eu prometo que no próximo Dia das Crianças publico alguma coisa menos mórbida. Mas vocês sabem que ultimamente estou revirando os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a carga de doença e a mortalidade de cada país em 2004. Com essas planilhas, e os documentos que as descrevem, é possível saber a importância de cada doença para diversas partes da população brasileira. Já listei as doenças mais importantes para os homens e para as mulheres, já listei para os idosos, e agora é a vez das crianças. (Em seguida: adultos.)
© Dûrzan cîrano (CC-BY-SA-3.0)
“Criança”, aqui, significa menores de 15 anos de idade, ou seja, os adolescentes estão um pouco incluídos também.
1.Pneumonia (11,5%) — As infecções respiratórias inferiores incluem não apenas as pneumonias bacterianas, mas também as pneumonias virais, como a bronquiolite.
2.Diarreia (10,9%)
3.Prematuridade e baixo peso ao nascer (8,6%) — Nascer antes do tempo (prematuridade) ou com peso baixo para a idade não costumam ser bem diferenciados em países com sistemas de saúde mal estruturados, daí a OMS ter agrupado as duas condições. Elas predispõem o recém-nascido a uma série de complicações, além da morte súbita.
4.Infecções e outros problemas dos recém-nascidos (6,1%) — Quando um recém-nascido nasce doente, muitas vezes uma doença leva à outra, daí elas serem contadas em conjunto. Como quase todos os partos do Brasil são feitos numa maternidade, esses bebês ficam internados até estarem saudáveis o suficiente para ir para casa.
5.Anomalias congênitas (5,8%) — Os defeitos de nascença podem até não ser comuns, mas infelizmente podem ser muito graves. Alguns, inclusive, podem ser prevenidos, como a anencefalia. (Dica: marque uma consulta antes de engravidar.)
6.Complicações do parto (5,1%) — A asfixia (falta de oxigênio) ou o trauma (acidentes) durante o parto são sempre um risco latente, e é por isso que a pessoa precisa de assistência obstétrica de qualidade.
7.Asma (4,2%)
8.Desnutrição proteico-calórica (3,7%) — Existem outros tipos de desnutrição, mas é nesse tipo que todo o mundo pensa quando se fala em desnutrição.
9.Depressão (2,2%) — Sim, crianças e adolescentes também podem ter depressão. Vale apena lembrar que um dos fatores de risco para depressão é a história pessoal de abuso sexual.
10.Cárie (1,7%)
Como de costume, o número entre parênteses é a proporção da carga de doença total das crianças brasileiras causada por cada doença. A carga de doença é medida em anos de vida perdidos por morte precoce, com um acréscimo pelo grau de incapacidade dos sobreviventes.
Gostaria de citar ainda quatro doenças que chegaram perto de entrar na lista: acidentes de trânsito, anemia por falta de ferro, meningite e enxaqueca. Também gostaria de explicar a exclusão de dois itens: “outros acidentes” e “transtornos endócrinos”. Não são exatamente doenças ou outros tipos de problemas; são grupos bem diversificados de problemas. O primeiro inclui todos os acidentes que não trânsito, afogamento, queda, envenenamento ou incêndio. O outro inclui tanto os mais variados problemas glandulares (como hipotiroidismo congênito) quanto todas as doenças do sangue exceto anemia ferropriva (por exemplo, anemia falciforme).
Várias doenças listadas já deveriam ter deixado de ser problemas de saúde pública há muito tempo. No caso da pneumonia e da diarreia, por exemplo, com raras exceções a morte de uma criança significa que ela não recebeu atendimento adequado. No caso de prematuridade, baixo peso e doenças típicas do recém-nascido, o percentual de mortes preveníveis ainda é menor, mas mesmo assim um pré-natal e um parto bem feitos fazem muita diferença. A asma deixa de ser incapacitante (ou letal) se receber tratamento adequado, e hoje em dia é difícil uma família realmente não ter dinheiro para dar comida para uma criança, então boa parte daquela desnutrição é falta de orientação da mãe (ou então alguma doença que não foi diagnosticada e tratada).
Na verdade, acredito que de 2004 para cá a situação tenha melhorado. Confira a conclusão de um artigo publicado no Boletim da Organização Mundial da Saúde de abril deste ano:
No Brasil, o desenvolvimento socioeconômico associado a políticas públicas orientadas à justiça social têm sido acompanhadas por melhorias nítidas nas condições de vida e um declínio substancial na desnutrição infantil, assim como uma redução no hiato do estado nutricional entre as crianças mais ricas e as mais pobres. Estudos futuros mostrarão se esses ganhos serão mantidos sob a atual crise econômica global.
Uma dessas “políticas públicas orientadas à justiça social” é a expansão e qualificação da atenção primária à saúde através da estratégia Saúde da Família. Outro dia escrevo mais sobre o papel da Saúde da Família na mortalidade infantil. Por hora, vamos nos focar na desnutrição infantil. Além de ser um dos problemas de saúde mais importantes das crianças brasileiras, a desnutrição também torna a criança mais suscetível a morrer por pneumonia e diarreia, que são as duas principais doenças das crianças brasileiras (ou eram, em 2004).
O artigo do Boletim da Organização Mundial da Saúde é uma adaptação de outro, no qual pesquisadores da USP compararam os inquéritos de saúde do IBGE de 1996 e de 1996/7, e encontraram uma redução de 50% na proporção de crianças desnutridas. Em seguida, analisaram os fatores associados a essa redução, e chegaram à conclusão de que o aumento do poder aquisitivo das famílias foi responsável por 21,7% da redução da desnutrição infantil; o aumento da escolaridade materna foi responsável por 25,7% da redução; as melhorias da assistência à saúde foram responsáveis por 11,6%; e o aumento da cobertura por saneamento foi responsável por 4,3% da redução da desnutrição infantil.
O Brasil ainda tem muito o que melhorar nesses quatro parâmetros, mas acredito que estejamos no caminho certo.
2.Diarreia (10,9%)
3.Prematuridade e baixo peso ao nascer (8,6%) — Nascer antes do tempo (prematuridade) ou com peso baixo para a idade não costumam ser bem diferenciados em países com sistemas de saúde mal estruturados, daí a OMS ter agrupado as duas condições. Elas predispõem o recém-nascido a uma série de complicações, além da morte súbita.
4.Infecções e outros problemas dos recém-nascidos (6,1%) — Quando um recém-nascido nasce doente, muitas vezes uma doença leva à outra, daí elas serem contadas em conjunto. Como quase todos os partos do Brasil são feitos numa maternidade, esses bebês ficam internados até estarem saudáveis o suficiente para ir para casa.
5.Anomalias congênitas (5,8%) — Os defeitos de nascença podem até não ser comuns, mas infelizmente podem ser muito graves. Alguns, inclusive, podem ser prevenidos, como a anencefalia. (Dica: marque uma consulta antes de engravidar.)
6.Complicações do parto (5,1%) — A asfixia (falta de oxigênio) ou o trauma (acidentes) durante o parto são sempre um risco latente, e é por isso que a pessoa precisa de assistência obstétrica de qualidade.
7.Asma (4,2%)
8.Desnutrição proteico-calórica (3,7%) — Existem outros tipos de desnutrição, mas é nesse tipo que todo o mundo pensa quando se fala em desnutrição.
9.Depressão (2,2%) — Sim, crianças e adolescentes também podem ter depressão. Vale apena lembrar que um dos fatores de risco para depressão é a história pessoal de abuso sexual.
10.Cárie (1,7%)
Como de costume, o número entre parênteses é a proporção da carga de doença total das crianças brasileiras causada por cada doença. A carga de doença é medida em anos de vida perdidos por morte precoce, com um acréscimo pelo grau de incapacidade dos sobreviventes.
Gostaria de citar ainda quatro doenças que chegaram perto de entrar na lista: acidentes de trânsito, anemia por falta de ferro, meningite e enxaqueca. Também gostaria de explicar a exclusão de dois itens: “outros acidentes” e “transtornos endócrinos”. Não são exatamente doenças ou outros tipos de problemas; são grupos bem diversificados de problemas. O primeiro inclui todos os acidentes que não trânsito, afogamento, queda, envenenamento ou incêndio. O outro inclui tanto os mais variados problemas glandulares (como hipotiroidismo congênito) quanto todas as doenças do sangue exceto anemia ferropriva (por exemplo, anemia falciforme).
Várias doenças listadas já deveriam ter deixado de ser problemas de saúde pública há muito tempo. No caso da pneumonia e da diarreia, por exemplo, com raras exceções a morte de uma criança significa que ela não recebeu atendimento adequado. No caso de prematuridade, baixo peso e doenças típicas do recém-nascido, o percentual de mortes preveníveis ainda é menor, mas mesmo assim um pré-natal e um parto bem feitos fazem muita diferença. A asma deixa de ser incapacitante (ou letal) se receber tratamento adequado, e hoje em dia é difícil uma família realmente não ter dinheiro para dar comida para uma criança, então boa parte daquela desnutrição é falta de orientação da mãe (ou então alguma doença que não foi diagnosticada e tratada).
Na verdade, acredito que de 2004 para cá a situação tenha melhorado. Confira a conclusão de um artigo publicado no Boletim da Organização Mundial da Saúde de abril deste ano:
No Brasil, o desenvolvimento socioeconômico associado a políticas públicas orientadas à justiça social têm sido acompanhadas por melhorias nítidas nas condições de vida e um declínio substancial na desnutrição infantil, assim como uma redução no hiato do estado nutricional entre as crianças mais ricas e as mais pobres. Estudos futuros mostrarão se esses ganhos serão mantidos sob a atual crise econômica global.
Uma dessas “políticas públicas orientadas à justiça social” é a expansão e qualificação da atenção primária à saúde através da estratégia Saúde da Família. Outro dia escrevo mais sobre o papel da Saúde da Família na mortalidade infantil. Por hora, vamos nos focar na desnutrição infantil. Além de ser um dos problemas de saúde mais importantes das crianças brasileiras, a desnutrição também torna a criança mais suscetível a morrer por pneumonia e diarreia, que são as duas principais doenças das crianças brasileiras (ou eram, em 2004).
O artigo do Boletim da Organização Mundial da Saúde é uma adaptação de outro, no qual pesquisadores da USP compararam os inquéritos de saúde do IBGE de 1996 e de 1996/7, e encontraram uma redução de 50% na proporção de crianças desnutridas. Em seguida, analisaram os fatores associados a essa redução, e chegaram à conclusão de que o aumento do poder aquisitivo das famílias foi responsável por 21,7% da redução da desnutrição infantil; o aumento da escolaridade materna foi responsável por 25,7% da redução; as melhorias da assistência à saúde foram responsáveis por 11,6%; e o aumento da cobertura por saneamento foi responsável por 4,3% da redução da desnutrição infantil.
O Brasil ainda tem muito o que melhorar nesses quatro parâmetros, mas acredito que estejamos no caminho certo.
Fonte: http://leonardof.med.br/
Postado por: Leonardo Araújo
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